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Archive for fevereiro \20\-03:00 2009

Efêmero

nuvem

Na manhã daquele dia, acordou cedo. Seus pulmões sentiam falta do aroma da manhãzinha. Há muito não acordava cedo.

Sentiu correr um vento frio nos pés descobertos. Tinha mania de excluir os pés do quentinho do cobertor, e ainda os deixava fora da cama. Uma mania interessante que escolheu ter, e que acabou virando necessidade na hora de dormir.

Viu lá fora as nuvens brancas, que encobriam todo o céu. Seria um dia frio, depois de uma semana inteira de um calor que lhe provocara cansaço e tristeza.

Limpou os olhos ali mesmo. Cobriu-se um pouco mais. Ainda tinha sono. Fechou os olhos, cobriu o rosto. A noite fora tranqüila.

Os pássaros anunciavam o começar de um novo dia. Sentiu grande paz naquele instante. Há muito não sentia tanta paz.

Pouco tempo, depois de um leve cochilo, o sono se foi. Resolveu levantar. Vestiu algo que espantasse o frio.

Desceu as escadas sem muita pressa. Queria testemunhar aquele dia com calma.

A barriga reclamou de fome. Foi até a cozinha, pôs para esquentar o café e o pão.

Enquanto isso, quis se ver no espelho. Insatisfeita, arrumou os cabelos soltos. Se olhou profundamente nos olhos sérios, parou por um momento. A testa franzida confessava sua preocupação. Passou os dedos sobre as sobrancelhas, desfazendo as rugas que ainda não tinha. Por um momento um calor; logo passou.

Lembrou de um tempo. Lembrou da chaleira antiga no fogo. Despediu-se da imagem com um sorriso sutil. Mais uma vez arrumou os cabelos.

Sentiu-se sozinha sem estar. Esteve por algum tempo, mas agora não. Quis estar naquela hora. Decidiu assim.

O pão estava como lhe agradava. O café quase queimou. A chaleira atrapalhada a obrigava tomar cuidado pra não se queimar. Assemelhava-se com alguém, achou triste graça nisso. Não encheu muito a xícara, comportou o pão cortado em dois num pequeno prato.

Ainda sem pressa, caminhou até a sala de estar. Passou um vento, a fez sentir estar. Aconchegou-se no sofá maior, a paz aconchegou-se, num silêncio jamais ouvido por ela.

Bebericou o café. Franziu a testa. Estava sem sabor, lhe faltava o doce. Levantou-se sem muito cuidado, derramou um pouco da pequena quantidade que ainda restava. Um pouco mais de café na xícara, cuidado com a velha chaleira. Temperou o café. Agora estava bem melhor.

Desejou se alimentar no quintal. Sentou-se perto do jardim, das flores. O Sol completou a luz que faltava. Mordeu o pão, bebeu mais do café.

Os olhos, distraídos, se perderam entre as pedrinhas no chão. Voltou para sala, deixou a porta aberta, terminou seu café.

Normalmente sentia um vazio. Pensava nas pessoas. Principalmente nas que jamais se lembrariam dela. Por um momento se sentia rodeada delas, mesmo que não fossem tão importantes assim. Na verdade não importa, elas não estavam ali.

Seus pensamentos afundavam de tal forma, e dentre aquelas pedrinhas, lembranças indiferentes. Cenas banais, mas que ela daria o presente pra voltar àquele tempo.

O frio estava mesmo indo embora. Da testa minava de leve o suor. O vento não volta mais.

Se importou, durante a vida, com coisas pequenas. Gostava de se isolar, e por isso não via as estrelas. Houve um dia em que foi ali fora, deitou no chão e viu as estrelas. Viu um cometa que se aproximou da Terra, como uma gozação, e seguiu seu caminho. Só queria apresentar-lhe o infinito. Um infinito existe.

Tentava contá-las, mas amanhecia antes que o terminasse. Sentia-se num mundo irreal, como se ela fosse apenas um sonho esquecido de alguém. E ele era tão distante, um desconhecido no mais íntimo seu.

Havia uma força, vinda de não sei onde, que lhe dava coragem pra sair de órbita. Bastava um pulo, e estava lá, entre as estrelas.

Parei em frente àquela árvore. Havia apenas uma fruta. Nela havia uma gota, como uma lágrima em um rosto. Delicadamente, a amparei com o dedo. Vi você ali. Sinceramente, posso dizer: errei muitas vezes, mas te amo tanto. Não queria ser assim como sou, embora sejas responsável pelo que sou.

Não suporto a sensação de o sentir longe de mim. É como ver todos os dias um velho amigo que nada me fez, e virar o rosto pra ele. Mas és mais que um velho amigo, és… quem és. Perdoe-me. Porque é de ti que me vêm as inspirações, os suspiros, o respirar.

Continuas o mesmo. Já eu, me sinto outra.

(continua…)

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